sexta-feira, 18 de junho de 2010

Tantas marias em tantos brasis.


José Aparecido da Silva


“A tradição de todas as gerações mortas
oprime como um pesadelo a mente dos vivos”
Karl Marx

Resumo: partindo da análise do curta-metragem “Vida Maria”, de Márcio Ramos, o presente artigo propõe uma reflexão crítica sobre as condições de vida dos brasileiros analfabetos que vivem em regiões economicamente desfavorecidas, nas quais as tentativas de transformações promovidas pelo ensino são frustradas pelo conservadorismo e pelo determinismo social de certas culturas e pela ineficiência dos órgãos governamentais em aplicar efetivas políticas educacionais de combate ao analfabetismo.
Palavras-chave: curta-metragem, problemas sociais, educação.

Abstract: starting from the analysis of the short film “Vida Maria”, by Márcio Ramos, this article proposes a critical reflection on the living conditions of illiterate Brazilians who live in economically disadvantaged regions, in which attempts of transformation promoted by teaching are frustrated by conservatism and social determinism of certain cultures and by the inefficiency of government agencies in implementing effective educational policies to combat illiteracy.
Key words: short film, social problems, education.

Não é de hoje que escutamos a expressão de coexistência de diversos brasis no nosso vasto território, repleto de diversidades culturais. Um deles, por sinal, de proporções enormes, é precário, injusto, pobre, determinista e representa uma parcela da população que sofre com a falta de informação e vive alheia aos acontecimentos modernos, vivendo à margem do progresso e excluídos dos anseios da democracia, da liberdade e da igualdade.
É uma parte do país que parou no tempo, e mesmo sendo participante da contemporaneidade, ainda reage ao mundo de forma pacata e passiva, difundindo de geração a geração costumes e ideias não mais condizentes com a realidade atual da totalidade humana.
O tempo hoje é outro, e não é medido por acontecimentos naturais do dia e da noite. O tempo atual, paradoxalmente, é atemporal, não cíclico e híbrido. Não atua em direção única, mas abrange toda a extensão existencial do indivíduo inserido num ciberespaço cada vez mais influenciador e dotado de potencialidades libertadoras nunca antes visto na história da humanidade.
Creio não ser culpa das pessoas a exclusão desse mundo de possibilidades da era do conhecimento. Não escolhemos aonde nascer ou a qual cultura pertencer, porém nascemos, no caso do Brasil, num país, teoricamente, democrático e adepto do Estado de Direito e da Declaração Universal dos Direitos Humanos que difunde nos artigos iniciais que todas as pessoas têm direito à liberdade, à igualdade, e principalmente, à vida, sendo este o maior de todos os direitos.
Mas como se beneficiar de tantos direitos se o mínimo é negado e várias pessoas são, como num estado determinista, condicionadas a sobreviver sem ajuda externa de um governo incapaz de promover a cidadania nos lugares mais necessitados?
Assim, lançadas à sorte, vão levando suas vidas num ambiente fechado e arcaico, sem relação com o mundo externo que as cercam, num sofrimento incalculável e não sentido por elas mesmas, já que não possuem um referencial de felicidade.  
Nisso o curta-metragem Vida Maria, de Márcio Ramos, nos coloca frente a frente com esses problemas, e racionalmente vamos tentando achar soluções para eles ao mesmo tempo em que nos emocionamos com as histórias idênticas e fictícias, porém simbólicas da realidade, de tantas marias.
As mãos pequeninas da Maria-Criança-Sonhadora que “desenham” o nome, transformam-se nas mãos grandes e limitadores da Maria-Adulta-Amargurada, que não mais escrevem e que servem, tão somente, para o trabalho pesado da subsistência. É uma tristeza cíclica e conservadora respaldada pela limitação do conhecimento, pela transferência de costumes, pela passividade em aceitar a vida como ela está e pela ausência da interferência governamental.
A vida educacional dessas marias coube em apenas uma página e, mesmo assim, limitadas à escrita dos seus próprios nomes e a sonhos nunca concretizados.

Referências.
ANDRADE, Maria Margarida de. Guia de redação em língua portuguesa. 2ª ed. São Paulo: Jubela Livros Ltda., 2007.
CIAMPA, Antonio da Costa. A estória do Severino e a história da Severina. São Paulo: Brasiliense, 2007.
FERRAZ, Janaína de Aquino; RIBEIRO, Ormezinda Maria. Oficina de produção de textos: competências linguísticas e midiáticas. Brasília: UnB.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.
LIMA, Antônio Oliveira. Manual de redação oficial: teoria, modelos e exercícios. 2ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. 374p.
MORAES, M. C. O paradigma educacional emergente. Campinas: Papirus, 2003.
RAMOS, Márcio/Joelma; Vida Maria [vídeo/curta-metragem]. Produção de Márcio Ramos e Joelma Ramos; Direção de Arte de Márcio Ramos. Brasil, 2006. Colorido, animação, 9 min., som. 

Para saber mais sobre o curta-metragem "Vida Maria" clique aqui.